A Historia do Povo Bantu
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A grande
maioria dos 11.000.000 habitantes que formam a população de Angola, são de
origem Bantu. No entanto, outra considerável parte é formada por misturas que
começaram muito cedo: primeiramente. entre os diversos grupos que migraram para
o território e depois com Europeus (na grande maioria Portugueses) durante a
colonização.
Existem ainda algumas minorias que não
são Bantu, como os Bochimane e um considerável número de Europeus. Há 3000 ou
talvez 4000 anos atrás, os Bantu sairam da selva equatorial (a região que é
hoje ocupada pelos Camarões e pela Nigéria) e dividiram-se em dois movimentos
diferentes: para o Sul e para Este criando a maior migração jamais vista na
áfrica. De causa desconhecida, esta migração continuou até ao século XIX. A
selva equatorial era uma área de passagem impossível. Só o machado ou o cutelo,
a rápida e nutritiva produção de banana e o inhame possibilitaram uma façanha
que durou séculos. O excelente nível de nutrição deu lugar a uma invulgar
explosão demográfica. A exuberância da selva equatorial, os rios e lagos das
grandes savanas, tão bons para a agricultura e a descoberta do ferro - um
mineral muito comum na áfrica - deram força à grande aventura. Caminhando
sempre em direcção ao Sul. estes vigorosos, armados, organizados e jovens
povos, venceram e fizeram escravos os indefesos pigmeus e os Bochimane.
O nome Bantu não se refere a uma unidade racial. A sua formação e migração
originou uma enorme variedade de cruzamentos. Existem aproximadamente 500 povos
Bantu. Assim, não podemos falar de uma raça Bantu, mas sim de povo Bantu, isto
significa uma comunidade cultural com uma civilização comum e linguagens
similares. Depois de muitos séculos de movimentações, cruzamentos, guerras e
doenças, os grupos Bantu mantiveram as raízes da sua origem comum. A palavra
Bantu aplica-se a uma civilização que manteve a sua unidade e foi desenvolvida
por pessoas de raça negra. O radical ntu, vulgar para a maioria das línguas
Bantu, significa homem, ser humano e ba é o plural. Assim, Bantu significa
homens, seres humanos. Os dialectos Bantu, e existem centenas, têm uma tal
semelhança que só pode ser justificada por uma origem comum. Os povos Bantu,
além do semelhante nível linguístico, mantiveram uma base de crenças, rituais e
costumes muito similares; uma cultura com características idênticas e
específicas que os tornam semelhantes e agrupados.
Fora da sua identidade social, são caracterizados por uma tecnologia variada,
uma escultura de grande originalidade estilística, uma incrível sabedoria
empírica e um discurso forte e interessante com sinais de expressão
intelectual. As línguas faladas hoje em Angola, são por ordem de antiguidade:
Bochiman, Bantu e Português. Das três só o Português tem uma forma escrita. Os
dialectos Bantu, apresentam uma unidade genealógica. Homburger, um eminente
estudioso do Bantu diz que o primeiro ponto obtido no domínio da linguística
comparada foi a unidade dos povos Bantu. Também diz, tendo em conta a história
desta unidade, que os primeiros descobridores Portugueses viram que os
Angolanos conseguiam comunicar com os povos da costa Moçambicana. Os Bantu
Angolanos estão divididos em 9 grupos etnolinguísticos: Quicongo, Quimbundo,
Luanda-Quioco (Tchôkwe), Mbundo, Ganguela, Nhaneca-Humbe, Ambó, Herero e
Xindonga, que por seu turno estão subdivididos em cerca de 100 subgrupos,
tradicionalmente chamadas tribos.
História
Bantu
Kubokuesa
kuna Kimbundu
(Introdução
ao Kimbundo)
O Kimbundu e os grupos linguísticos africanos; o grupo Bantu, inserido na
família Congo-Cordofaniana
A grande maioria dos linguistas está de acordo em como, no Continente Africano,
as línguas se dividem por quatro grandes famílias: a Afroasiática (inclui as
línguas Berberes do Norte de África, as Cushitas da Etiópia e da Somália e
ainda as semitas, abrangendo o hebreu, o árabe e o aramaico), a Nilo-Sahariana
(constituída pelo Sudanês, o Sahariano e o Songhai), a Niger-Congo ou
Congo-Cordofaniana (inclui numerosos grupos predominantes para sul do Sahara,
de que destacamos os Bantu, para sul do Equador) e Khoisan (línguas dos Pigmeus
da floresta tropical do Congo Democrático e línguas faladas “com estalinhos”
pelos povos !Kung, vulgarmente conhecidos como Hotentotes, Bosquímanos ou, em
Angola, Mucancalas)[1]. O Kimbundu é uma língua do grupo Bantu, pertencendo à
família linguística Niger-Congo ou Congo-Cordofaniana. é plural de muntu,
radical comum a quase todas as línguas do grupo. Muntu quer dizer indivíduo,
pessoa, ser humano, significando, portanto, bantu, indivíduos, pessoas ou seres
humanos. Em Kimbundu, a palavra mutu significa pessoa, sendo o seu plural, atu,
pessoas, gente. Pelos exemplos acima indicados, podemos desde já concluir que a
principal característica das línguas Bantu é o facto da flexão – isto é, a
formação do género, feminino ou masculino, e do número, singular ou plural – se
fazer por meio de prefixos.
Nações Bantu de Angola; diferenças
dialectais nos subgrupos mbundu; o kimbundu de Ambaka
O território de Angola situa-se quase exclusivamente dentro da área de difusão
das línguas bantu. São nove as nações bantu de Angola, correspondendo a cada
uma delas uma língua diferente:
Nação
Idioma
Bakongo
Kikongo
Mbundu (ou Ambundu)
Kimbundu
Lunda-Tchokwe
Tutchokwe
Ovimbundu
Umbundu
Ganguela
Tchiganguela
Nhaneka-Humbe
Lunhaneka
Herero
Tchiherero
Ovambo
Ambo
Donga
Xindonga
De todas estas nações, só os
territórios dos Mbundu, dos Ovimbundu e dos Nhaneka-Humbe se circunscrevem ao
espaço angolano. Os das outras são todos atravessados pelas fronteiras
políticas delineadas após a Conferência de Berlim de 1885. Os Bakongo, por
exemplo, repartem-se pelos estados de Angola, Congo Democrático e Congo
Popular, os Lunda-Tchokwe, cujo território é atravessado pelo rio Kassai,
dividem-se entre Angola e o Congo Democrático, na província do Katanga
(ex-Shaba), os Ganguela entre Angola e a Zâmbia e, finalmente, os Herero, os
Ambo e os Donga, entre Angola e a Namíbia.Cada uma destas nações é dividida por
diversos subgrupos, a cada um dos quais corresponde uma variante dialectal. A
nação Mbundu reparte-se por 11 subgrupos (ou etnias), disseminados pelas
províncias de Luanda, Bengo, Malanje, Kuanza Norte e ainda pequenas bolsas no
Uíge e no Kuanza Sul. São, portanto, 11 as variantes do Kimbundu, consoante a
difusão geográfica dos 11 povos que constituem esta nação: Ngolas, Dembos,
Jingas, Bondos, Bângalas, Songos, Ibacos, Luandas, Quibalas, Libolos e
Quissamas.O Kimbundu, à semelhança das outras línguas bantu, não tem tradição
escrita. Os primeiros a escrevê-la e a estudar-lhe as regras gramaticais foram
os missionários capuchinhos e jesuítas de Ambaka. Fizeram-no com o fim de
ensinar a língua portuguesa e o catecismo aos africanos. Foram eles que
introduziram os princípios ortográficos ainda hoje vigentes.Nos séculos XIX e
XX surgem estudiosos do Kimbundu, de onde destacamos Héli Chatelain, Cordeiro
da Matta, António de Assis Júnior e Óscar Ribas.
Ortografia e fonologia
O Kimbundu deve sempre grafar-se com escrita sónica. As cinco vogais, a, e, i,
o, u, são todas abertas. Antes de outra vogal, ie u funcionam como
semi-vogais.mbcomo em mbambi, “gazela”, “frio”nvcomo em nvula, “chuva”nd como
em ndandu, “parente”ngcomo em ngiji, “rio”nj como em njila, “pássaro”,
“caminho”h como em hima, “macaco”, distinto de ima, “coisas”O m e o n servem
para nasalar, daí que tenham surgido, por exemplo, vocábulos como Angola
derivado de ngola (rei) ou embondeiro derivado de mbondo (árvore).O h é sempre
aspirado, como em henda (graça, misericórdia).O r é sempre brando e pode ser
trocado por d ou, menos frequentemente, por l. Por exemplo, kitari ou kitadi
(dinheiro), ditadi ou ritari (pedra); kudia ou kuria (comer); kolombolo ou
koromboro (galo).O k substitui sempre o q da língua portuguesa, bem como o c
antes de a, o e u.O g nunca tem o valor de j, mesmo antes de e ou i. Ndenge
(mais novo) e ngindu (trança) lêm-se ndengue e nguindu.O som nh deve, em nosso
entender, escrever-se como em português, embora haja quem escreva ni ou ny. Por
exemplo, dikanha, dikania ou dikanya (tabaco).Não vemos, de resto, necessidade
do emprego do y em Kimbundu, embora certos autores o usem enquanto prefixo para
fazer o plural de ki. Em tal caso sugerimos a grafia i.
Classes nominais e concordâncias
Nas línguas bantu, os nomes substantivos ordenam-se em classes ou grupos
consoante os pares de prefixos que definem os singulares e os plurais. O
Kimbundu tem 10 classes nominais.
CLASSES
SINGULAR
PLURAL
EXEMPLO
1ª mu
a
mutu, atu – pessoa(s)
2ª
mu
mi
mutue, mitue – cabeça(s)
3ª
ki
i
kima, ima – coisa(s)
4ª
ri
ma
ritari, matari – pedra(s)
5ª
u
mau
uta, mauta – arma(s)
6ª
lu
malu
lumbu, malumbu – muro(s)
7ª
tu
matu
tubia, matubia – fogo(s)
8ª
ku
maku
kuria, makuria – comida(s)
9ª
--
ji
mbiji jimbiji – peixe(s)
10ª
ka
tu
mona tuana – criança(s)
Estes prefixos absolutos, que designam
a classe a que o nome pertence e o número em que se encontra, distinguem-se dos
prefixos concordantes, que enumeraremos consoante as classes e o número a que
correspondem.
CLASSE SINGULAR
PLURAL
1ª
ua
a
2ª
ua
ia
3ª
kia
ia
4ª
ria
ma
5ª
ua
ma
6ª
lua
ma
7ª
tua
ma
8ª
kua
ma
9ª
ia
--
10ª
ka
tua
A concordância faz-se, em
kimbundu, através do prefixo do substantivo que inicia a frase e lhe serve de
sujeito.Exemplifiquemos:Mubika uami uakala umoxi / Abik’ami akala atatuO meu
escravo era um / Os meus escravos eram trêsMukolo uami uakala umoxi / Mikolo
iami iakala itatuA minha corda era uma / As minhas cordas eram três
Kialu kiami kiakala kimoxi / Ialu iami ikala itatu
A minha cadeira era uma / As minhas cadeiras eram três Rilonga riami riakala
rimoxi / Malonga mami makala matatu O meu prato era um / Os meus pratos eram
três
Uta uami uakala umoxi / Mauta mami makala matatu
A minha arma era uma / As minhas armas eram três
Lumbu luami luakala lumoxi / Malumbu mami makala matatu
O meu muro era um / Os meus muros eram três
Tubia tuami tuakala tumoxi / Matubia mami makala matatu
O meu fogo era um / Os meus fogos eram três Kuria kuami kuakala kumoxi /
Makuria mami makala matatu A minha comida era uma / As minhas comidas eram três
Mbiji iami iakala imoxi / Jimbiji jami jakala jitatu
O meu peixe era um / Os meus peixes eram trêsKamona kami kakala kamoxi / Tuana
tuami tuakala tutatuA minha criança era uma / As minhas crianças eram três.
Menino
pobre de Luanda, com o seu papagaio de papel, desenho de Neves e Sousa.
Um pouco de cultura Bantu
Mpambu na língua Kikoongo, uma das linguas faladas em
Angola(África), significa: Encruzilhada. N`jila em Kikoongo
significa: Caminho.
Pambu N`jila, que pode ser traduzido como “Aquele que conhece o caminho mais
curto”, são os mensageiros que transitam entre o natural e o sobrenatural,
trazendo aos homens os desígnios dos Makisi e levando a Eles as suplicas e as
oferendas dos homens. Receberam por este trabalho o título de Aluvaiá
(mensageiro). São sempre e em qualquer ocasião os primeiros a serem chamados, a
receberem oferendas, etc. São os nossos Guardiões (Nlundi), que abrem e fecham
as “porteiras” de nossa aura, permitindo ou não a penetração das energias com
as quais lidamos e convivemos durante toda a nossa vida. Se nosso contato com
Eles for fraco, menos força Eles têm para nos defender. A cada vez que levamos
nosso pensamento a Eles, acendemos uma vela oferecendo-a a Eles, uma garrafa de
cachaça entregue na encruzilhada, uma rosa vermelha, seja o que for, estamos
nos ligando a Eles e, portanto, fortalecendo nossa ligação. Ao acordarmos
devemos agradecer a Nzambi Mpungu pela noite e pela nova oportunidade de
mais um dia e saudarmos o nosso Guardião solicitando que possamos contar com
Ele por mais um dia.Muitos querem igualar os Pambu N`jila ao diabo, por total
ignorância, colocando Neles chifres e rabos. Diabo vem da palavra diavolo que
significa “o mentiroso” e a palavra demônio é formada por demos, que significa
povo (democracia, demonstração, etc.) e ions, que significa ligação; portanto
podemos afirmar que Pambu N`jila é um demônio e que o diabo nem demônio é. Em
kikoongo a palavra que os padres que montaram o dicionário de
português-kikoongo e kikoongo-português, encontraram para diabo foi “temba”
que, ao pé da letra, significa “o mal dentro de nós”, pois nossos Ancestrais,
assim como nós, não acreditamos em um ser extracorpóreo que nos force ou nos
conduza a praticar o mal contra a nossa vontade. A palavra tentação vem de
tester (grego) que significa teste ou prova. Quando caímos em tentação, na
realidade estamos enfrentando um teste ou uma prova, que só nossa consciência,
pelo livre arbítrio, poderá suplantar ou não, deixando-nos, sempre,
responsáveis pela conseqüência de nossos atos, pensamentos e palavras.As cores
reservadas a eles são a preta e a vermelha juntas. Embora respondam a qualquer
hora, dia e lugar, nós lhes reservamos as segundas-feiras.
Koluki: O
Imaginário Bantu na Cultura Angolana
Contrariamente ao que pretendem fazer
convencer alguns, sem sucesso, o imaginário indígena brasileiro, embora
marginalizado, é basicamente índio. A dignificação do negro, agrupamento humano
de origem alógena, na literatura brasileira é um fenómeno recente, mais a mais,
na telenovela, em que ainda aparece a fazer os papéis mais baixos reservados na
escada social, - moleque ou doméstica.
Vale recordar que, só com a Semana da Arte Moderna em 1922 é que o negro
brasileiro conquistou o seu papel de sujeito na literatura brasileira.
Pretender o contrário para a literatura angolana é falsear a evolução do
fenomeno literário angolano, como procuraremos demonstrar à luz da raiz da sua
cultura. Ou seja, trago o assunto doutro modo: “in limini”, o angolano
assume-se como sujeito da sua literatura no conflito civilizacional entre o
colono e o colonizado. A literatura angolana emerge da manifestação inequívoca
deste direito à diferença, uma identidade literária distinta da potência
colonial, como uma reação ao labéu racista da inferioridade congenital do negro
angolano, será estribado na polémica do “A voz de Angola clamando no deserto”,
em 1902. “Mutatis mutandis”, já vai mais de um século, e a história parece
querer repetir-se a todo gás e a todo tempo...
O imaginário angolano é, primacialmente, veiculado nas línguas maternas
angolanas de origem bantu, cujas ocorrências são detectadas em empréstimos e
coloquiasmos embebidos na literatura angolana, para não falarmos dos
provérbios, fábulas, contos e adivinhas, recolhidas e trabalhadas por Óscar
Ribas, Raúl David, Costa Andrade, S. Cacueji, Rosário Marcelino, etc, ou mesmo
atravessados nos textos narrativos e poéticos de Agostinho Neto, Viriato da
Cruz, António Jacinto. O pregão e o drama do “modus vivendi” da quitandeira,
metonímia do sofrer colectivo (lutando pela vida), é paradigmático nestes
autores, bem como enquanto cultora e transmissora dos valores antigos de
geração para geração, veiculados por via da oralidade.
Jofre Rocha, Jorge Macedo, Timóteo Ulika, expressamente em “Kandudu”, sem esquecer
os prosadores e poetas da nova fornada despoletada nos anos 80, nomeadamente,
António Fonseca, recolhendo peças da oralidade kikongo e não só, Jacinto de
Lemos, este resgata os coloquialismos dos musseques, bebendo empréstimos
linguísticos decorrentes da interpenetração idiomática entre a primeira e
segunda línguas. O mesmo ocorre com outros poetas como Panguila, Curry Duval,
Lopito Feijó, Luís Kandjimbo e dos também ficcionistas Cikakata Mbalundu e
Rosária da Silva e Miguel Júnior, este último no seu texto narrativo “kikinhas
da fonseca”, cuja indumentária, autêntico modelo de representação cultural e
simbólica dos ilhéus, do “hinterland” de Luanda, tende a desaparecer, daí que
os escritores e demais homens de cultura deverão curar da sua reabilitação e
preservação.
A contribuição desses e outros autores não se esgotam no âmbito
sócio-linguístico, assim sendo, fazem apelo ao ambiente e espaço tributário do
nosso contexto “local”, geografia física e emocional que presidem o aludido
imaginário identitário.
A literatura angolana é uma expressão da cultura angolana e africana, pois, por
mais que doa a muito boa gente em “crise permanente de identidade”, a
literatura angolana não é resultante da cultura portuguesa, embora seja
primacialmente, não exclusivamente, cultivada em língua portuguesa. Esta é
devedora do contexto plurilinguístico e multicultural das suas ocorrências em
Angola, que se distingue e contradistingue do vernáculo falado em Portugal.
Mesmo em Portugal, a língua não ocorre da mesma maneira em Trás os Montes, em
Setúbal ou em Belém e no Algarve. Basta ver que enquanto uns falam vinho outros
falam binho; enquanto outros falam Bié outros ainda falariam Vié, o que já deu
motivo para “trazer água na barba” ou “pôr as barbas de molho, quando a palhota
do vizinho estiver a arder”, - provérbios que dizem respeito ao imaginário
português e que presidiriam o imaginário colonial ou neocolonial nos dias que
correm. De resto, o imaginário português será o filão espiritual que enforma a
sua cultura, substrato em que assentará a literatura portuguesa e seus
afluentes. Disso se ocupara com proficiência e autoridade o pensador português
Eduardo Lourenço. Convenhamos ainda que, a literatura portuguesa será aquela em
que se deverá encaixar a literatura exótica cultivada por colonos ou
neo-colonos em Angola. O caso de Geraldo Bessa Victor e companhia é
paradigmático.
Nestes termos, a literatura angolana, apesar de exercitada maioritariamente em
Português, traz no seu substrato a cultura angolana, cuja matriz é africana e
bantu. A literatura angolana será, por maioria de razão, representada
simbolicamente por aquela franja que se revê basicamente nesta matriz bantu,
tudo resto será subsidiário e periférico, e qualquer tentativa de colocar um
subgrupo marginal (no sentido antropológico do termo) ou que se assume como
“gueto” sócio-linguístico, cultural ou rácico no seu centro, estará viciada e
peca por defeito ou por excesso (dependendo do julgamento de valor de cada um),
`a partida , refletindo uma profunda crise de identidade cultural, geradora de
conflitos ainda que latentes.
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DESIGNAÇÃO: MWANA MPWEVO
DESCRIPÇÃO: Máscara feita em madeira, representando figura feminina, utilizada em
cerimônias ligadas aos ritos da puberdade e a outras cerimônias sociais.
ORIGEM: Ovingangela
FUNÇÃO: Animadora de cerimônias
MATÉRIA: Madeira e Fibras
DIMENSÕES: 30 cm x 25 cm
A peça Mwana Mpwevo, é feita em madeira e fibras vegetais representando a beleza
da mulher Ngangela. Ela retratada de forma ousada, os pormenores dos elementos
que integram o conceito de beleza feminina no imaginário dos Ngangela. É sempre
usada por um homem, em cerimônias sociais ou rituais.
A face em madeira tratada, banhada em sucos vegetais avermelhados, e o toucado
elaborado a partir de fibras vegetais.
A máscara Mwana Mpwevo atualiza o papel determinante da mulher com base no
regime matriarcado.
É muito apreciada na comunidade, pelo que não admira o pormenor do seu
embelezamento e o naturalismo de suas feições. De realçar o realismo inerente
às tatuagens, particularidade muito apreciada na beleza da mulher Ngangela.
O toucado é feito com borbotos em fibras vegetais empapados em argila vermelha.
De trás de toucados e na base da máscara aparece rede que se liga ao fato do
bailarino.
DESIGNAÇÃO: MBUNDA
DESCRIPÇÃO: Máscara com a função de dispor bem. Feita em fibras vegetais,
varas, missangas, alfinetes e botões.
ORIGEM: Ovingangela
FUNÇÃO: Cria buo disposição entre os participantes em cerimônias rituais e
sociais.
MATÉRIA: Fibras vegetais, troncos, missangas, alfinetes de latão e botões.
DIMENSÕES: 50,5cm x 20 cm
A máscara Mbunda está presente nas cerimônias mais diversas (rituais da
puberdade, casamento, nascimento, entronização), e tem como função primeira
criar um ambiente hilariante entre os circundantes. O gesto do bailarino recai
principalmente na exibição de movimentos eróticos, utilizando muitas vezes
acessórios para propositadamente provocarem momentos de feição cômica no evoluir
da sua exibição.
Participa em cerimônias várias, fazendo peditórios a favor dos atores sociais
intervenientes nas referidas cerimônias.
Também designada por Likisi ou Cinganji, é feita de fibras vegetais e
ornamentada com partícula em argila, botões e alfinetes.
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Kibatulu/Mambu
(Artigo/Opinião)
Estatuetas: arte popular com símbolos mágicos
O pensador é a mais famosa estatueta angolana. É considerada uma obra de arte
fidedignamente angolana, figura emblemática do país, que aparece, inclusive, na
filigrana das notas de kwanza, a moeda do país.
Katwambimbi
Na tradição cultural angolana, as estatuetas são
usadas em ritos mágico-religiosos, desempenhando a função de amuletos que
conteriam forças ou seres sobrenaturais.
Uma das práticas utilizadas nesses ritos e na adivinhação, em consulta feita
por uma pessoa interessada numa intervenção contra um mal, seja ele físico
(doença) ou social. O sacerdote (nganga) utiliza vários processos de
adivinhação, geralmente com objetos que simbolizam qualquer coisa, como
estatuetas.
A adivinhação na região de Luanda é feita de modo simplificado, usando apenas o
muxakatu, pedaço de madeira talhado com várias ranhuras, onde é friccionada uma
vara. No nordeste de Angola, e etnia lunda-tchokwe ainda usa o cesto de
adivinhação, chamado de ngombo, do qual o sacerdote adivinhador retira pequenas
figuras esculpidas em madeira, as quais irão determinar a sorte do consulente.
Foram estas figuras que resultaram na mais famosa estatueta angolana, “O
Pensador”.
É considerada uma obra de arte fidedignamente angolana, uma figura emblemática
do país e que aparece inclusive na filigrana das notas de kwanza, a moeda
nacional. Mas o Pensador tem origem numa tradição “inventada” ou
“convencionada”.
Na verdade, os primeiros Pensadores angolanos foram esculpidos nas oficinas do
Museu de Dundo, em data posterior a 1947. Neste ano, por iniciativa da Diamang,
a então Companhia dos Diamantes da Luanda, foi criado no povoado de Dundo um
museu de arte tradicional e de coleções etnográficas e arqueológicas.
Os funcionários da empresa, na maioria belga e portuguesa, chegaram a contratar
artesãos locais e instalaram-nos em oficinas, incentivando-os a esculpir na
madeira ou a modelar no barro figuras que fossem genuinamente “nativas”, mas ao
mesmo tempo interferindo, no sentido de aproximar as formas de uma estética que
julgavam ser mais convencional, no sentido ocidental.
Houve casos, por exemplo, de figuras míticas africanas cujos pés, seguindo a
tradição, eram grandes e foram reduzidos por razões “estéticas”. A invenção do
Pensador angolano deve-se a um caso destes. Ao conhecer figuras usadas nos
ritos de adivinhação, os europeus induziram os africanos a criar uma figura
que, de algum modo, se assemelhasse a uma estatuária de origem grega,
particularmente cara aos escultores europeus renascentistas, como Leonardo da
Vinci ou Rodin: o Pensador.
Na origem do Pensador estão algumas figuras do cesto de adivinhação tahi
(tchokwe). Se virmos o simbolismo de qualquer uma delas, verificamos que,
curiosamente, nenhuma sugere atitude introspectiva, pelo menos na acepção grega
clássica.
Katwambimbi é uma dessas figuras. Representa um momento de lamentação
(carpideira).O seu aparecimento vaticina infortúnio, se junto dela não surgir
outra peça que amenize esse prognóstico. Personagem figurada com as mãos à
cabeça, está relacionada com feitiços mbimbi, com os quais o adivinho previne o
consulente contra injúrias, aconselhando o uso de amuletos para defesa
principalmente das crianças.
A estatueta designada por kalamba e kuku wa Pwo (ascendente feminino), tem uma
das mãos no queixo e a outra colocada sobre o ventre. Personifica o estado de
apreensão, agonia e receio de fantasmas; vaticina mal iminente e pode indicar
que o consulente não tem sorte porque esqueceu os seus antepassados (paternos e
maternos) ou que uma herança não foi bem repartida pelos seus descendentes. Se
a figura aparecer de cabeça no meio das outras, é sinal de vida, mas se surgir
deitada ou de pé, aumentam as preocupações de uma futura mãe. Junto ao símbolo
upite (riqueza) indica dívida ou roubo; com chota (casa do povo) prevê
prejuízos na casa, no gado ou na agricultura.
Estatueta de homem e mulher unidos pode anunciar ao consulente descendência,
questões resultantes de dote da noiva não satisfeito, ou lembrar compromissos
entre duas pessoas. Se for uma estatueta estilizada representando três, quatro
ou cinco pessoas em fila indiana, sobre uma base comum, vaticina um mal
apanhado durante viagem ou proveniente de coisas que foram transportadas; com
upite (riqueza), bom prestígio, e com tchilôwa (feitiço), é fatídico. Lembra ao
viajante que deve respeito aos ídolos que encontrar no seu caminho e que só se
pode abordar o feiticeiro quando este estiver sozinho, longe do povoado.
Já uma estatueta de mulher grávida significa recomendação para o
consulente construir um altar próprio e usar amuletos propícios à natalidade,
como jinga, chisola ou ruemba, para evitar espíritos de mulheres que faleceram
durante o